quarta-feira, 27 de agosto de 2014

O dia em que Pires e Mococa calaram o Maracanã

Mococa disputando bola com Carpegianni no meio campo (foto de Rodolpho Machado, in Placar nº 503). 

Passei minha infância, fase em que mais me envolvi emocionalmente com o futebol, entre o final dos anos 70 e início dos anos 80, período que coincidiu com a época das vacas magras para o Palmeiras.

Mas isso não significa que não houve nada que a torcida palmeirense pudesse celebrar naquela época.  E pra mim, um jogo em especial foi marcante e faço questão de lembrá-lo aqui como forma de homenagear o centenário do velho Palestra Itália.

No dia 8 de dezembro de 1979, o Palmeiras, dirigido por Telê Santana (último clube antes de assumir a seleção) entrou em campo no Maracanã para enfrentar o Flamengo em jogo que valia vaga na semifinal do campeonato brasileiro de 1979 (que contou com o regulamento mais esdrúxulo de todos os tempos, mas isso são outros quinhentos). Diante de um público de mais de 112.000 pagantes, teve pela frente o Flamengo de Zico, Adílio, Junior e Tita, que tinha conquistado dois títulos estaduais no mesmo ano (isso mesmo!) e se apresentava como favorito, afinal já era um esboço daquele que viria ser campeão mundial em 1981.  Pelo lado alviverde despontava jogadores mais jovens e menos renomados como Jorginho, César (não o “maluco”) e Mococa, acompanhados de alguns mais experientes como Pires, Pedrinho e Jorge Mendonça.

Dias antes, já prevendo um jogo decisivo em que o Palmeiras podia entrar com a vantagem do empate, Telê Santana foi categórico:

(foto de José Pinto, Revista Placar, 502)


“não pensem que para garantir o empate meu time vai se retrancar. Nada disso. Para mim, a melhor maneira de se chegar ao empate, sem passar sustos, é entrar para ganhar.” [1]


E em campo, o que se viu foi exatamente isso. Se considerando apenas a fama dos jogadores, o Flamengo era considerado favorito, dentro de campo o que se viu foi um massacre alviverde. Jogando com simplicidade, naquela tarde o Palmeiras dominou completamente o adversário, executou lançamentos precisos, toques rápidos e triangulações perfeitas.




Com Cantarelli batido, César, o 9 palmeirense perdeu este gol incrível, chutando no travessão. Podia ter sido mais (foto de  Ignácio Ferreira, in Placar nº 503, dezembro de 1979)

Ressaltando aspectos como o posicionamento do Pires, junto com Mococa na entrada de área; os deslocamentos laterais executados pelo Jorge Mendonça e pelo centroavante César  abrido espaços para os laterais Rosemiro e Pedrinho; as inversões dos pontas Baroninho e Jorginho; e as jogadas ensaiadas, a Revista Placar (principal meio de comunicação esportiva escrita naquela época) ressaltou o verdadeiro baile tático que o time de Telê Santana aplicou sobre o time rubro-negro, comandado pelo, até então, técnico da seleção brasileira, Claudio Coutinho. Vale a pena ver os melhores momentos dessa verdadeira aula de futebol. 

www.youtube.com/watch?v=B-3MkCZ3hNU

No final, uma agressão covarde do Beijoca (atacante flamenguista) acabou sendo um retrato do jogo em que a goleada categórica (4 x 1) foi apenas uma consequência diante da dimensão da superioridade palmeirense naquele dia. Eu, que estava naquele dia no Rio de Janeiro, lembro  não só do jogo, mas também da sua repercussão.  


Ficha técnica do jogo (Revista Placar nº 503)
Na semifinal, apesar do esforço, o time do Palmeiras não conseguiu superar o forte time do Internacional e acabou eliminado. Mesmo sem o título, em enquete feita com 221 jornalistas brasileiros ainda naquele mês, nada menos do que 197 indicaram o então técnico palmeirense Telê Santana como o melhor técnico brasileiro, credenciando-o para assumir a seleção brasileira no início de fevereiro de 1980. 


Se não serviu para levar o Palmeiras ao título, certamente aquele time deu uma contribuição fundamental ao futebol brasileiro ao servir para colocar o Mestre Telê Santana em justa evidência, culminando no brilhante trabalho frente à seleção após aquela a Copa de 1982. Valeu Palmeiras! O futebol brasileiro agradece! Fica aqui a imagem do primeiro gol (na falta de Youtube, Placar publicava os gols desta forma).
Primeiro gol em fotos de Ignácio Ferreira e Rodolpho Machado, in Placar nº 503.




[1] Entrevista à Revista Placar de 3 de dezembro de 1979.

domingo, 10 de agosto de 2014

Homenagem em dose dupla

Foto de Rodolpho Machado na revista Placar nº696, de 23 de setembro de 1983.

Na semana passada, no jogo no Maracanã contra o Goiás, o Fluminense prestou uma bela homenagem a uma das mais famosas duplas da história do futebol brasileiro que deu tantas alegrias à torcida nos anos 80: Assis e Washington (com direito a distribuição de máscaras deles para a torcida). O blog Futebol Sonoro aproveita para registrar também sua homenagem.

No início dos anos 80, quem dominava o cenário no futebol carioca e nacional era o Flamengo. Esse cenário mudou com a chegada de Washington e Assis ao Fluminense em 1983 após uma passagem vitoriosa de ambos pelo Atlético-PR, onde tinham se consagrado com um título estadual após 12 anos de jejum e levaram o time paranaense até a semifinal do Campeonato Brasileiro de 1982 (faltou muito pouco para não eliminar o Flamengo).

A chegada deles ao Flu ocorreu sem maiores alardes. O time carioca amargava anos sem conquistas e depositava suas parcas esperanças em contratações de jogadores menos conhecidos. Mas o time “deu liga”, a começar com a conquista da Taça Guanabara, que levou o time para a final do campeonato daquele ano. Em setembro de 1983, após a conquista da Taça Guanabara, a revista Placar já deu destaque a esta dupla com uma reportagem especial que iniciava da seguinte forma:

Um é paulista e o outro baiano, mas passariam perfeitamente por dois cariocas autênticos. Assis, 29 anos, e Washington, 23, chegaram ao Rio de Janeiro há pouco mais de dois meses e já assimilaram toda a malandragem que a cidade lhes podia ensinar. Juntos desde os tempos de Atlético Paranaense, eles combinam jogadas, armam esquemas particulares imprevisíveis e sabem como ninguém tirar partido da irritação do adversário. Resultado: conquistaram a Taça Guanabara defendendo um time, o Fluminense, que até eles chegarem estava totalmente desacreditado”.

A final do estadual foi disputada em um triangular com Bangu e Flamengo. Após um empate contra o Bangu, chegou ao jogo contra o Flamengo com a necessidade de ganhar para continuar na briga pelo título e eliminar o rival. O jogo seguiu empatado até os 45 minutos do 2º. tempo, quando Assis recebeu um lançamento de Delei, entrou na área e tocou na saída do goleiro Raul, fazendo o gol decisivo para o título do Flu. De tão marcante, a torcida tricolor passou a reverencia-lo com o canto “Re-cor-dar é viver...Assis acabou com vocês” (parafraseando a música “Recordar é viver, eu ontem sonhei com você”).  Vale a pena conferir a reportagem especial do Sportv sobre este jogo com depoimento de Delei (https://www.youtube.com/watch?v=w758fKWUGUc), assim como conferir o canto daquela torcida em jogo que comemorou o centenário do Fla x Flu (e presença de Assis): https://www.youtube.com/watch?v=RkuijwEqYSI.

Em 1984, novamente contra o Flamengo, Assis acabou repetindo a dose e o Flu saiu-se bicampeão (www.youtube.com/watch?v=0oqMQ_S8Bsg ).  Washington também costumava ser decisivo, como na final de 1985 (ano do tricampeonato) ao marcar um belo gol contra o Flamengo em jogo em que Assis estava de fora, contundido, jogo que mereceu uma reportagem especial na Globo, com relato do goleiro Paulo Vítor e o lateral Leandro, do Flamengo: https://www.youtube.com/watch?v=_4_s7cAOELs.

Como se não bastasse, nesse período a dupla – chamada de Casal 20 – levou o time ao título brasileiro em 1984 que veio em um empate sem gols contra o Vasco (após vitória de 1 x 0 com gol de Romerito). O Sportv fez uma reportagem especial de um jogo marcante daquela trajetória: a vitória sensacional na semifinal contra o Corinthians, fora de casa, por 2 x 0, com participação do Assis lembrando aquele jogo.

Enfim, entre 1983 e 85, aquele Fluminense conquistou o tricampeonato estadual e foi campeão brasileiro com um time que além do forte conjunto e do paraguaio Romerito (o craque do time), teve como um dos maiores símbolos o chamado Casal 20, totalmente identificado com o time e sua torcida.

Tal como foram unidos em campo, Washington e Assis acabaram falecendo em um curto intervalo de tempo (entre 25 de maio e 6 de julho), deixando um imenso pesar por parte da torcida do Atlético-PR e do Fluminense. Lembro que no dia em que Assis foi enterrado em Curitiba, simbolicamente caiu uma chuva torrencial. Até o céu estava triste.

Por tudo que construíram junto ao futebol, pelo que representaram principalmente para as torcidas do Atlético-PR e Fluminense, qualquer homenagem será pouca. Segue aqui o vídeo exibido no telão do Maracanã. É de se emocionar: